sexta-feira, outubro 06, 2006

Jamais a delação


Olá pessoal!
Ultimamente tenho pensado em questões um tanto quanto inquietantes e acho que isso se deve ao meu aniversário logo mais (todo mundo fica um pouco pensativo nessa época, ou não?). O fato é que ontem estava atento ao tempo que foi, no que está e no que virá. Pensava sobre o que tenho feito de meu tempo e de como venho resolvendo minhas risadas e lágrimas. Claro que me deparei com perguntas quase sempre sem respostas e é justamente aí que tomei conta de como a angústia pode ser perigosa e muitas vezes fatal. Lembrei de alguns fatos e até ri (pouco).
Bem, nunca fui lá muito fervoroso mesmo tendo estudado a maior parte do tempo em instituição católica. Lembro-me de passagens em que minhas dúvidas não se contiveram e criaram até problemas, como certa vez na quinta ou sexta série numa aula de Ensino Religioso com uma freira que estava falando da suposta pureza de Maria e eu pensei comigo que mesmo que a Grande Mãe do cristianismo não tenha transado para conceber o Salvador, Jesus acabava com a questão da virgindade ao nascer de parto normal, uma vez que destruiu o hímem da própria progenitora. Claro que levantei essa questão em sala e tive o azar de ter em minha frente uma freira topeira e provinciana que chocada preferiu me mandar para fora da sala ao invés de se sair muito bem com a plausível explicação de que Maria era pura não por ter ou não o "lacre", mas por não ter se entregado aos prazeres da carne. Se bem que nesta fase da vida eu não estava procurando explicações, mas confusão (tudo isso muito bem pensado na cabeça de uma criança quase adolescente muito esperta, inteligente e possuidora de um incrível talento para criar confusões e ser soberba). Sobre essa fase - a adolescência - devo dizer uma coisa: Achei uma bosta e não tenho a menor saudade daquela vida insossa e cheia de cravos e espinhas que me marcaram para sempre. Odiei ser adolescente e mesmo que não tenha, por exemplo, tentado me matar como muitos fazem, quis em vários momentos matar colegas de sala e professores imbecis (em especial os de matemática, física e química). Lembro de ter assistido ao filme "Um dia de fúria" com o Michael Douglas e no mesmo instante pensar em como poderia usar um taco de madeira na cabeça de algumas pessoas que me incomodavam por serem medíocres, feias, chatas ou tudo junto. Felismente me contentei com minha fértil imaginação e não levei os planos tão a sério por medo das conseqüências e por uma dose excessiva de preguiça.
Outro caso muito bom foi quando resolvi cometer um atentado na aula da folclórica Dona Alvair. Tinha uma garota na sala chamada Nathália Martine que era evangélica, péssima aluna em tudo, que amava a Sandy e o Júnior e se divertia muito fazendo as coreografias de grupos de axé no fundo da classe. Era muito divertida a moça e embora tivéssemos pouco em comum eu adorava incentivá-la a me fazer rir. Certo dia ela me disse na primeira aula:
Ela: Lucas, você não sabe o que eu trouxe comigo?
Eu: Não sei, mas você vai me contar!
Ela: Bombas!
Eu (com os olhos brilhando para saciar minha gana terrorista): Ah! E quando vamos usá-la?
Ela: Então ... que tal nas aulas da tarde, depois do almoço?
Eu: Pode ser! Por quê não?
Ela: Na aula de Biologia da Dona Márcia.
Eu: Não tenho coragem, não. Ela é muito barraqueira e esquisofrênica. Vai ser na aula da Alvair durante a chamada.
Ela (rindo muito): Isso!
Soltei uma bomba ensurdecedora, a professora saiu de si, todos riram, fomos suspensos (toda turma) e uma cretina me dedou. Claro que minha fúria vingativa voltou-se contra ela no futuro, mas isso não vem ao caso agora. O melhor foi minha faceta de injustiçado, com direito a choros, soluços e água com açúcar.
Irmã: Lucas, sei de fonte limpa que foi você.
Eu (com cara de espanto): Eu!? Mas quem falou uma coisa dessas? Não fui eu mesmo.
Irmã (investigativa e ainda com certeza): Você pode ser sincero comigo e não despencar em meu conceito. Sei que foi você!
Eu (agora me esforçando e sacando que teria que fazer algo eficiente e rápido): Não, não vou assumir algo que não fiz. Como pode ter certeza?
Irmã: Isso é comigo, mas tenho.
Eu: Não, não (começando a chorar), não fui eu!
Irmã: Por quê você está chorando? Nunca o vi assim ...
Eu (caprichando no choro e ainda soluçando): Como por quê? Sei quem foi, mas jamais falaria. Não sou disso, não ...
Ela (levanta-se, vai até o filtro de água mineral, enche um copo d'agua com açúcar): T0me meu filho! Acredito em você. Sei que não é um aluno fácil, mas sempre foi sincero e assumiu seus erros.
Eu (com as últimas lágrimas e uma vontade reprimida de gargalhar, mas simulando ainda uns soluços): Obrigado Irmã!
Ela: Agora me conte quem foi.
Eu: Mas nem sob tortura. Não mesmo! Prefiro ser punido.
Ela: Não concordo com sua postura, mas devo respeitá-la.
Bem, ao sair dali esbocei um sorrisinho cínico e pensei no quão mal e perspicaz havia sido. Devo confessar que me orgulho disso até hoje.