domingo, maio 04, 2008

"Meu mundo e nada mais"



Quem me conhece um pouco acaba me perguntando se eu gosto mais do Rio ou de São Paulo e eu – sempre muito polido e sincero – respondo que gosto das duas e que gosto tanto que queria ser milionário o suficiente para ter uma cobertura de dois andares na Gávea e outra na Avenida Paulista (naquele prédio bem alto próximo ao Conjunto Nacional). Milionário o suficiente para não fazer nada que lembrasse trabalho em hipótese alguma e arrumar preceptores inteligentíssimos e super intelectualizados para estudar filosofia, arquitetura, história da música, das artes plásticas, vídeo-arte, performances (para tentar ao menos desconfiar do que isso se trata), história geral e do Brasil e mais tudo o que me desse na telha.

É claro que muito provavelmente eu não serei assim nunca e embora isso seja uma tristeza e melancolia latentes de meu coraçãozinho classe-média, tenho sempre que inventar uma vida pra mim.

Quando eu vivia no Rio de Janeiro dava muito menos bola para praia do que hoje em dia, era branco feito um morador de Campos do Jordão e usava a Orla de Copacabana todos os dias para caminhar meus quinze quilômetros por noite. Sim, eu esperava o sol desaparecer por completo ou então freqüentava a Praia do Leme ou do Arpoador bem cedinho, de manhã e, quando o sol ia começar a tostar, me mandava. Abominava praia cheia! Hoje, quando vou até o mar, passo o dia inteiro e fico na maior alegria quando a praia enche. Também tinha como um de meus programas preferidos ir até a Livraria da Travessa (a mais tradicional da cidade) e ler livros inteiros sem comprar nem um postal. Até hoje não entendo como aquela gente podia ser tão simpática comigo, um cara-de-pau profissional que nunca nem café tomou por lá.

Quanto às aventuras gastronômicas, eu sempre comia lanches no Cervantes, no Bar Baco, cachorro-quente de forno numa lanchonete atrás do Copacabana Palace, sorvete no Alex lá no Posto 2 ao lado da Duvivier (diziam que Roberto Marinho mandava seu motorista buscar o sabor pistache e creme), lanchinhos no Leme Light, entre tantos outros “points” de comida barata, gostosa e nada saudável. E como era duro! Eu até hoje não sei como conseguia viver bem por lá!
Porém o que me deixava feliz de fato era a casa Peters carioca. Lá viviam Ana, Afonso e Jana e todos os três são fantásticos e fonte riquíssima para muitas e muitas crônicas. Vocês já viram aquelas famílias que não “douram a pílula”? Eles são assim, ou seja, falam e brigam alto, gostam de “botecar”, são claros, dizem tudo na lata e se amam imensamente, mas tanto que sempre estão aptos a acolher mais um e assim o fizeram comigo. Não que eu tenha morado com eles, mas passei a freqüentar a residência e não sai mais. Ou melhor, sai para me mudar para São Paulo e até hoje sinto uma saudade rascante e acho que não acharei em nenhum outro lugar uma família similar.

Quanto à São Paulo, eu adoro viver aqui. Gosto dos amigos que fiz e faço, gosto da agitação cultural e metropolitana, adoro caminhar pela Avenida Paulista e pela Rua Augusta, de comer “croissant” no Benjamin Abrahão, doces na Elite e na Dona Deola, de ler também gratuitamente na Livraria Cultura (porém aqui não fico tão à vontade porque são menos amistosos), de fazer supermercado de madrugada na Monte Alegre, de ir ao Cine Unibanco, ficar ouvindo discos no Neto, dos showzinhos de música da Vila Madalena, das baladas mais estranhas e impróprias, de ir aos shows do Ibirapuera e de ficar tentando entender “a dura poesia concreta de suas esquinas” e claro que também dos museus e galerias que faz de São Paulo o único lugar onde você realmente se sente “cult bacaninha”.

Aqui também tenho refúgios que são as casas da Daisy e do Carlos com sua infanta Letícia (família que também não economiza no amor e que vive com a casa cheia), das moças “lá de cima” (Júlia e Ana do ES e Aline de Sergipe), da Alessa – a ingrata que eu mais amo e mais algumas aí. O fato é que mais uma vez eu concordo com o Oscar Niemeyer quando perguntaram o que ele achava mais importante na vida e ele respondeu laconicamente que eram as pessoas. Porque umas poucas certezas todos tem, dúvidas surgem com a velocidade da luz (e isso é muito produtivo), sonhos via de regra não se realizam, a vida é para ser dura mesmo (cada dia mais acredito que a gente nasce pra se foder mesmo), mas as pessoas é que nos salvam e infeliz de quem não as possuem. Não quero ficar aqui defendendo aquelas pieguices de sejamos amigos e vamos todos nos amar, apenas declarando meu mais profundo amor a quem quero bem e às cidades que me acolheram. Acho que hoje posso me considerar um “penapolense meio bossa nova e rock and roll”. Porque o Rio é charmoso como a bossa e São Paulo é árido e vibrante como o rock.

Abraços do Lucas, o mais Franco.

quinta-feira, maio 01, 2008

Viver... só me faltava mais essa!


Olá pessoal!

Hoje estava pensando em como as pessoas extrapolam o bom senso ao se verem na difícil tarefa de conviver em grupo. A impressão que eu tenho é a de que vai chegar um momento em que todos terão que tomar um remédio qualquer para conseguirem, ao menos dopadas, dividir espaço, atenção, coisas e mais o que tenha que ser compartilhado. Como é duro! E eu já quero o meu remédio logo.

Bem, estava no ônibus que me trouxe de São Paulo para Penápolis quando me deparo com uma passageira ao meu lado muito espaçosa e que, dormindo e roncando, jogava seu corpo para o meu lado e me acordava com o inesperado contato (isso porque eu é que estava acomodado no corredor). Lá pelas três horas da manhã e já não tão cavalheiro assim me dirigi a ela cutucando-a:

Eu: Moça, moça!


Ela (acordando atônita): Oi!


Eu (muito direto): Você ronca e joga seu corpo para o meu lado e com isso não consigo dormir.


Ela fez uma cara de surpresa.


Eu (extremamente didático): Pois é... o fato é que seu ronco pode ser uma anomalia do sono e para isso cabe um médico, mas seu corpo em cima do meu é um problema de fácil solução. Basta que você jogue seu corpo para o lado da janela e aí eu posso tentar ignorar seu ronco e tentar também dormir.


Ela (muito sem graça): Ah, tá! Vou tentar.


Eu (ainda amigável): Sim, e vai conseguir! Qualquer coisa eu te acordo e vamos os dois olhando um pra cara do outro até o final da viagem. Acordados!


Ela (agora mais confiante): Não precisa! Vou conseguir.


Eu (agora querendo rir): Eu sei que vai!

Claro que você, caríssimo e escasso leitor, pode achar minha atitude exagerada, mas o fato é que a Senhorita veio deste momento até Penápolis sem nem encostar mais em mim e eu pude exercitar o meu direito de poder dormir numa viagem de sete horas pela madrugada fria e úmida que fazia. E é aí que me pergunto o porquê dela não ter esse cuidado antes de alguém criar um clima desagradável como foi o caso. Será assim tão difícil entender que dentro de um ônibus a gente não pode se sentir na poltrona da sala de nossa casa e ficar tão à vontade? Eu sinceramente não entendo o porquê desta falta de protocolo das pessoas e, falando bem francamente, nem quero.

Outro caso desta natureza é a sala de aula. Eu abomino essa gente que vai pra aula copiar resuminho de lousa sem ter lido a matéria previamente e o fato é que NUNCA em toda a minha vida tive cadernos completos e resumos porque sempre gostei mais de questionar e debater do que de copiar. Confesso que sempre tive um certo desprezo por aluno que não abre a boca e não participa, mas pior do que esse é aquele que não quer que a aula seja debatida porque prefere o conteúdo mastigado. Isso é o final dos tempos! Fogueira para eles! Semana passada entrei numa briga por causa disso numa aula sobre como a tecnologia influenciou as mudanças das artes plásticas. Para ficar mais fácil de entender, vai uns exemplos: Como foi o impacto do surgimento da fotografia na produção plástica de sua época? Ou ainda qual o impacto do surgimento do trem e da Revolução Industrial na produção de sua época? Enfim, tema interessantíssimo com professora imperdível e aí vai o que ocorreu por causa de um idiota fruto do processo de analfabetização do Brasil (esse sim um projeto levado a sério neste país):

Professora: Quando vemos Van Gogh enlouquecido para tentar entender a arte do Monet criando um novo estilo...


Aluno (interrompendo): Professora, mas essa aula vai cair na prova ou não?


Eu (não agüentando): Fique tranqüilo que você não vai conseguir entender caindo ou não na prova. Eu hein!


Professora (com um sorriso de canto de boca): Gente, não se preocupem com a avaliação agora que vou dizer o que quero logo mais.


Aluna (do mesmo naipe): Mas... você vai deixar o material na xérox, né?


Eu (só para atrapalhar): Professora, volte ao Van Gogh porque eu quero ter aula. Depois essa gente se bate disputando fila na xérox e quem sabe eles não se matam. Já pensou?

Nem preciso dizer que virou um tumulto só e que a professora, que me adora e é sarcástica, riu sem nem tentar disfarçar.


Outra coisa que não consigo compreender é a questão das filas para gestantes, idosos e deficientes (que acho mais do que justo) ser tão banalizada. Estava eu numa agência do Banco Real da Alameda Santos quando chega uma moça obesa com seus vinte e poucos anos e pega a senha preferencial ao invés da senha normal. Todos que estavam sentados esperando muito porque a agência estava cheia se entreolharam pensando o mesmo que eu, ou seja, o que tem essa moça além de uns quilos a mais. Juro que desta vez pensei que não iria me indispor, mas ocorreu que bem na hora de me chamar vi que a senha dela passou na minha frente no sistema e fui junto com ela:


Eu: Moça, qual é a sua? Porque você não está com barriga de grávida, não é deficiente e muito menos idosa.


Ela (muito cara-de-pau): Eu estou grávida, sim!


Eu (bem incisivo): Ah, não está não! Você está obesa e isso é bem diferente! Acontece que tem muita gente esperando e ninguém está disposto a cair no seu truque. Bem, eu pelo menos não vou!


Ela (chocada): Estou grávida sim!


Eu: E onde está o seu exame? Quero vê-lo agora! Vocês não querem?


Quando olhei o caixa estava rindo disfarçadamente e logo veio outro funcionário para continuar com a fila e eu fui atendido ao mesmo tempo que a falsa gestante. E não sintam dó porque eu sei o que é uma barriga de grávida e a dela não era!


Eu poderia ficar aqui escrevendo por horas situações deste tipo, mas acho que já me cansei de mim, de você e de tudo isso e hoje vou ficar por aqui. A minha única pergunta é: Por quê a convivência social está ficando tão difícil? Parece até que está tudo em suspensão e que não há mais parâmetros. Como pode?

Abraços do Lucas, o mais Franco.